domingo, 28 de março de 2010

Artigo I


A 5ª CONFERÊNCIA MUNDIAL SOBRE MUDANÇAS DO CLIMA EM COPENHAGEN: AS LIMITAÇÕES DAS AÇÕES AMBIENTAIS E O PAPEL BRASILEIRO FRENTE ÀS DISCUSSÕES SOBRE O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
“Se fôssemos deveras sábios compreenderíamos bem os sinais dos tempos, e conhecendo as suas carências e vantagens, ajustaríamos a nossa própria posição. Em vez de fitarmos, perturbados, a distância obscura, olhemos um pouco, calmamente, ao nosso redor, a cena complexa na qual estamos” (THOMAS CARLYLE)
Autor: Leandro Oliveira Carneiro[1]
RESUMO
O encontro mundial realizado no ano de 2009 em Copenhagen consolidou mais uma oportunidade para que os questionamentos e limites do desenvolvimento econômico que envolve de um lado países ricos e emergentes pudessem ser discutidos sob a ótica de uma mudança climática global, aparentemente, em rumo.
Este texto busca discutir de maneira breve, qual o impacto da 5ª Conferência sobre Mudança do Clima em Copenhagen, bem como suas contradições e como o Brasil tem se posicionado sobre os questionamentos e liberdade para se desenvolver economicamente à medida que o discurso da preservação parece pesar sobre a sua realidade, inclusive do ponto de vista da legislação ambiental.
Palavras-Chaves: Meio Ambiente, Política, Desenvolvimento e Copenhagen
ABSTRACT
The international meeting held in 2009 in Copenhagen further consolidated opportunity for questions and limits of economic development involving one side of rich and emerging countries could be discussed from the perspective of global climate change, apparently bearing.

This paper aims to discuss briefly, the impact of the 5th Conference on Climate Change in Copenhagen, as well as its contradictions and as Brazil has positioned itself on the questions and freedom to develop economically as the discourse of preservation seems to weigh
about their reality, including in terms of environmental legislation.
Key Words: Environment, Politics, Development and Copenhagen

1. INTRODUÇÃO
As discussões sobre uma nova forma de relação com os recursos naturais e uma mudança de caráter econômico entre as civilizações e o globo parecem definitivamente irreversíveis.
De forma a questionar o papel dos países nessa enorme discussão, a V Conferência sobre Mudança do Clima realizada em Copenhagen no ano anterior gerou profundas expectativas sobre a forma dos anos e ritmo de desenvolvimento econômico, antes apenas nos países desenvolvidos, e hoje com contribuição das nações emergentes.
Entretanto, ao contrário do que se poderia imaginar, o que se viu neste encontrou foram resultados tímidos para as possíveis e reais necessidades que se fazem priorizar nas ações antrópicas que vem contribuindo para transformações de ordem climática no mundo.
Além das vicissitudes de se combinar interesses alheios para a questão ambiental. 2009 foi marcado como o ano de crise econômica que se espalhou pelas nações que ao longo da sua história extrapolaram e continuam a extrapolar os recursos do planeta mediante um consumo elevado. Basicamente, isso foi o estopim de um fracasso anunciado para o encontro pois a questão política de solução para os problemas econômicos estava acima de qualquer prerrogativa sobre a questão climática.
O Brasil, como nação emergente e com grande visibilidade no cenário mundial atualmente, foi protagonista do encontro não apenas pelos avanços econômicos internos, como por ser este uma das últimas nações a desfrutar de significativos recursos naturais. Ao mesmo tempo, o país é cobrado sob suas perspectivas e qual o tipo de modelo de desenvolvimento precisa ser adotado (ou forçado a adotar) que permita compatibilizar suas necessidades com os avanços obtidos com as políticas para o meio ambiente nacional.
O texto aqui apresenta algumas considerações sobre o encontro realizado em Copenhagen em Dezembro de 2009 onde notadamente a questão ambiental esteve sujeita a um grau inferior em relação à economia de modo geral, e como o Brasil se posicionou ou irá se posicionar frente a esse tipo de desafio político global no seu caminho de desenvolvimento.

2. MEIO AMBIENTE: NOVOS CAMINHOS PARA UMA NOVA LEGISLAÇÃO
A questão ambiental no mundo passou a ser conhecida principalmente a partir da década de 70. Entretanto, a sua popularização se dá através dos debates técnicos e científicos que emprestam a esse tema, uma necessidade que dialoga entre demanda e oferta e na capacidade que o planeta tem a oferecer as nações como um todo e para o benefício humano.
Obviamente que a observância sobre os cuidados ambientais já são notados, ainda que timidamente, muitos anos trás. Mas se é possível destacar alguma similaridade entre a década de 70 e o tempo atual em que está situado o evento realizado em Copenhagen em 2009 é que curiosamente de alguma maneira, a questão ambiental entrou e se consolidou nos discursos principalmente em uma fase de crise. E talvez seja esse o grande entrave nas negociações e apreços internacionais sobre o tema e sua conciliação em interesses distintos.
Quando se realiza o evento em Estocolmo (1972), a década de 70, segundo HOBSBAWN (1995) já se caracterizava como o fim da Era de Ouro, ou seja, das elevadas produções e farturas que inundavam grandes partes do globo através das econômicas centrais para as periféricas. Em 1973, o choque do petróleo gerou formidável desequilíbrio mundial, quando o recurso fóssil passava agora a ter grande parte das suas reservas controladas por nações cuja história perpetuava diversos conflitos. O endividamento tornou-se explosivo para os inúmeros países que usavam abundantemente um recurso natural (e esgotável, aparentemente)[2] a preços relativamente baratos e agora se viram na necessidade de financiar um crescente modo de vida consumista por valores nunca antes vistos.
Como agora, o debate em torno das mudanças climáticas, ainda que seus efeitos ou origens padeçam de explicações mais exatas, está sendo consumado novamente em um período de crise financeira que assola os países mais industrializados do mundo. A crise, como concebida, foi antes de qualquer coisa, ou continua a ser de um modelo de vida pouco sustentável, principalmente quando se tenta compatibilizar a necessidade da natureza humana sob a ótica do consumo.
Em um trabalho anterior[3], fornecemos algumas explicações sobre como o capitalismo através dos mecanismos científicos tornou possível a apropriação do discurso ambiental sujeitando novas relações entre o ser humano e os recursos naturais. Mas tal apropriação condicionou que tais atividades para os ganhos comerciais trouxessem a tona uma sistemática de problemas que a sociedade agora precisava enfrentar.
As iniciativas de reprodução do capital através das grandes corporações, sejam suas atuações no ocidente ou oriente, invariavelmente não correspondiam ao quadro, do ponto de vista ambiental, demonstrado nos seus países de origens. Ou seja, a busca pela industrialização em larga escala, trazia também a perspectiva de aumento de importância econômica local e regional, mas a deterioração das condições ambientais que serviam a sociedade, e muitas vezes com apoio político das nações receptoras desses investimentos. Até este ponto, o direito ambiental ainda amadurecia alguns dos seus princípios que começaram a ser discutidos e ser incluído na necessidade de decisões norteadoras para alguns casos de investimentos ou explorações de recursos naturais e porque não, até mesmo humanos.
A década de 70, ao semear os debates em torno da questão ambiental, ainda pouco fortalecido de respostas dos diversos segmentos da sociedade, deu os primeiros passos para que a questão ambiental e sua gestão pudesse ser incorporar novos conceitos e dessa forma estar presente do ponto de vista de novas legislações.
O direito ambiental basicamente tem sua consolidação no princípio do direito humano fundamental, ainda que em linhas gerais, é nesse ramo em que ao se avaliar os cuidados com a qualidade ambiental e sua prerrogativa de preservação derivam a questão da prevenção, precaução, poluição, entre outros.
Outro destaque importante na constituição do direito ambiental como ferramenta de discussões e avaliações para a sociedade refere-se a sua própria extensão e forma para atuar. Os recursos naturais em muitos casos podem ultrapassar limites territoriais bem como as conseqüências das explorações. Alguns acidentes de graves conseqüências locais e regionais[4] alimentaram a necessidade de uma readequação da atividade produtiva a leis que permitiriam que o ser humano pudesse exercer dignamente a sua vida e sua relação com aquele espaço que pudesse ser afetado significativamente.
No caso brasileiro, o surgimento da questão ambiental e suas ramificações foram tratados com imenso desprezo quando se analisa as políticas desenvolvimentistas públicas exercidas nos anos 70 através dos PND I e II no regime militar[5]. A atração por maciços investimentos industriais sem os devidos cuidados quanto a gestão do meio ambiente pareciam levar o país a um caminho contraditório naquilo que se almeja como sustentável.
Entretanto, devido a pressões internacionais cujos interesses também são resultados de políticas capitais na busca de um manejo e transformação dos recursos naturais, o Brasil se viu obrigado a uma mudança institucional interna e externa para que fosse dada a devida importância aos problemas ambientais.
Sob essa ótica, o direito ambiental brasileiro possui hoje a sua disposição um conjunto de leis em muitos casos aclamados internacionalmente, e cuja origem está na criação de esferas governamentais de poder para lidar especificamente com o propósito de regulamentar a questão do meio ambiente no seu território. Com a criação do Conselho Nacional do Meio Ambiente, ou CONAMA, a legislação ambiental brasileira viu nascer através da Resolução CONAMA 01/1981, o primeiro mecanismo de avaliação das atividades produtivas e seus respectivos impactos no meio em que este deverá ser inserido. Ao argumentar e exigir que algumas atividades sejam licenciadas ambientalmente, a adoção do chamado Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) é fruto de um dos princípios importantes do Direito voltado para o Meio Ambiente, ou seja, o da prevenção.
No Brasil, a questão ambiental ganha mais instrumentos para a defesa dos interesses populacionais e do meio ambiente com o advento em 1989 do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que determina no seu Art. 225, que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
Essas competências somadas ao evento da ECO-92 colaboraram para que o princípio da precaução, já amplamente difundido nos países europeus pudesse ser consolidado no Brasil, mas principalmente no mundo. Tal princípio, segundo autores, vem constantemente sendo criticado, pois a sua natureza de proibição de uma atividade capitalista baseado em circunstâncias não-técnicas reproduziria um embargo comercial oculto entre países dando margens para possíveis discussões em outras instâncias internacionais como a Organização Mundial do Comércio (OMC).
Os arcabouços após a ECO-92 que já eram amplos ganharam cada vez mais aperfeiçoamento em nível mundial, embora estejam sempre em constante questionamentos. O Brasil também não poderia ser diferente. Na década de 90, o Brasil trouxe novos instrumentos jurídicos, onde se destacam por exemplos, a Lei 9.795/99 (Lei de Educação Ambiental)[6], Lei 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais), a Lei 9.966/2000 (também conhecida como Lei da Poluição do Óleo)[7] a Lei 9.985/2000 (Institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza), além de resoluções específicas do CONAMA, como 237/97 (trata do licenciamento ambiental), a 344/2004 (sobre os procedimentos a serem adotados nas dragagens), a 357/2005 (trata do lançamento de efluentes nos corpos d’água), entre outras.
Concomitantemente a essa evolução sob a legislação que trata da questão ambiental, o Brasil vem percorrendo caminhos conflituosos na busca de processos que permitam a ampliação de mudanças sociais, culturais e principalmente econômicas e que são inerentes ao grau do desenvolvimento do país que se busca alcançar.
O retrato desse desenvolvimento econômico dos países centrais frente a outras nações difere historicamente sob a gestão do seu patrimônio natural. O tempo, aparentemente, guiou as nações para o esgotamento dos ecossistemas locais quando os elevados processos industriais vinham acompanhados de uma rara combinação quanto à gestão ambiental. E por esse motivo, existem fortes pressões internacionais levando os países emergentes a adotarem medidas de preservação muito mais ampla do que aquelas que vinham sendo adotadas na Europa, Japão e Estados Unidos. Já países como o Brasil sugerem a adoção de tecnologias mais limpas na produção e consumo.
Tal reflexão, dentro do ponto de vista da legislação nos remete a pensar por diversos ângulos sobre o que move essa movimentação política em prol da gestão ambiental em países menos desenvolvidos. Em um texto de MORE (1999) sobre a segurança ecológica e sua aplicabilidade, ele demonstra que a questão ambiental parece não encontrar limites entre nações ou territórios. Por isso, há a hipótese de que em prol do bem da humanidade e dos recursos naturais, problemas ambientais de ampla magnitude poderiam ser discutidos mediante sanções ou mesmo uma coerção sob uma nação.
A visão da segurança ecológica segundo MORE, tem respaldo na obra de TIMOSHENKO, Ecological Security: Response to Global Challenges, onde são tratados os problemas humanos, militar e político. Entretanto, ao se tentar construir o princípio da segurança ecológica é possível que na mesma moeda, seja questionada a autoridade de um país, ou seja, sua soberania. Citamos como exemplo recente a Lituânia cuja matriz energética estava baseada em energia nuclear. Entretanto, o risco de novo acidente nuclear como o que ocorreu em 1986 com Chernobyl, fizeram as nações europeias despertarem para os graves impactos que ocorreram, já que após ruir a última fronteira de esperança de continuidade do Comunismo em 1989, ficou patente o sucateamento da estrutura dos países do leste, principalmente sua manutenção com tecnologia nuclear. Com base nisso, a Lituânia, em Janeiro de 2010[8], passou a ser dependente de energia externa. Apesar da sua eficiência, as usinas nucleares estão eminentemente sendo questionadas pelo tamanho do risco oferecido. Fica a questão: seria dado o mesmo tratamento a um país como a França, onde 86% da sua matriz é nuclear?
O caso brasileiro também é questionado já que após anos sem grandes obras estruturais, as últimas fronteiras para a exploração da mais comum matriz energética (hidráulica) estão concentradas na região amazônica (UHE de Santo Antônio, Jirau e Belo Monte). Apesar da sua necessidade para o crescimento do Brasil já que a energia elétrica é um insumo produtivo, tais empreendimentos irão ocasionar impactos sociais e naturais significativos, sem falar se haverá uma preservação ambiental contundente. Na outra ponta, a exploração da bacia amazônica pode afetar outros países da América Latina[9], pois esse bioma vai além das fronteiras brasileiras e contraditoriamente, ainda sofre com a questão do desmatamento em grande escala[10]. Seria esta uma situação apropriada para o princípio da Segurança Ecológica, principalmente quando existe o discurso da internacionalização da Amazônia?
Como se vê os princípios e aplicabilidade do direito ambiental encontram no mundo situações das mais diversas. De fato, o tema vem ganhando cada vez mais força, e sendo incluído nas esferas políticas entre outras searas da sociedade. A questão é se o debate é realizado de maneira coerente e se as dúvidas colocadas em pauta encontrarão as respostas corretas. Mas mais do que isso, o século XXI vem testemunhando uma nova geopolítica e econômica onde os novos atores agora buscam no presente período atingir um nível de maturação desenvolvimentista que sempre esteve nas mãos das sociedades americanas, europeia e japonesa. Foi por causa dessa discussão, que em 2009, as chances de acordos para um mundo em mudança climática parecem ter sido sepultadas e com poucas oportunidades de renascimento em um curto prazo.

3. COPENHAGEN 2009: A DISCUSSÃO AMBIENTAL SOB AS CONTRADIÇÕES DE UM MUNDO DESIGUAL
A V Conferência sobre Mudança do Clima realizada em Copenhagen tinha como meta discutir o que alguns painéis governamentais e não-governamentais vêm levantando sobre as modificações climática em todo o globo e a interferência da atividade humana como causa de todo esse processo. De maneira majoritária esse debate ganhou certo apelo popular em 2005 através do filme do ex-presidenciável americano Al Gore chamado ‘Uma Verdade Inconveniente’.
Contudo, a defesa sobre a necessidade de mudanças do “efeito humano” para com o planeta, reside nas modificações da sociedade como um todo e no sistema que a sustenta para sua sobrevivência. Antes mesmo do seu início, o ceticismo em torno de um acordo multilateral que pudessem se concretizar em metas eficazes para diminuição da emissão de gases já era bastante elevado.
Assim como em outras posições, a conferência esbarrou em problemas econômicos gigantescos. Originada por gestões arriscadas com o objetivo de sustentar o chamado ‘American Way of Life’, a crise eclodiu em 2008 e se alastrou pelo mundo financeiro, necessitando das nações uma imensa quantidade de políticas de reativação com dinheiro público[11]. Desse embate se gerou provavelmente o principal motivo para o fracasso do evento: a quem se deve salvar primeiro, o planeta ou as pessoas (entenda-se aqui o sistema capitalista)[12]?
Outros questionamentos se somaram ao evento, pois algumas pesquisas sobre as mudanças climáticas pareciam não fornecer bases exatas para as conclusões que se seguiam gerando descrédito para os países mais industrializados e se as políticas de preservação atingiriam seus objetivos. Dessa forma, gerou controvérsias severas para o papel de algumas dessas nações na busca do desenvolvimento e sua sustentabilidade.
Os países mais ricos consideram que de certa forma, uma possibilidade grande de contrapartida para preservação ambiental como um todo deve vir das nações emergentes, principalmente por elas concentrarem quase 40% da população mundial e em crescente velocidade para consumir. A China tornou-se um caso emblemático, pois a sua presença política e econômica tem sido chave para o desequilíbrio em inúmeros acordos. Se de um lado é ela hoje um dos grandes emissores de gases nocivos para a atmosfera e com níveis de poluição insustentáveis para sua própria poluição, por outro lado, sua mão de obra farta e barata e com poucas resguardas sociais, trouxeram os preços e a possibilidade de consumo mundial a um nível jamais visto.
Do outro lado, as expectativas criadas pelos Estados Unidos também pouco mudaram o panorama do evento. Na possibilidade de que a eleição de Barack Obama cujo discurso ambiental do seu partido (Democratas) foi um dos motes da campanha, revelou-se pouco aproveitável. Apesar do reconhecimento da necessidade de mudanças em prol da preservação ambiental, a cultura do consumo americano dificilmente poderá ser modificada a curto prazo. As idéias de uso de tecnologias ambientalmente corretas irão simbolizar mudanças nas raízes dos custos desse estilo de vida. Ao se adotar essas prerrogativas, os mecanismos sob a ótica ambiental tendem a mudar não apenas a forma de consumir, mas o custo das coisas. Dessa forma, parte das idéias para uma melhor gestão ambiental tem sido de certa forma, “empurradas” para os países emergentes para que os mesmos realizem formas de se alcançar o desenvolvimento sustentável, o que implicaria consequentemente em críticas abertas aos modelos de gerir, por exemplo, a região Amazônica, reforçando a idéia de internacionalização[13].
Mas e o papel brasileiro diante da pouca mobilidade de acordos no evento em Copenhagen? O Brasil após anos de sucessivas crises econômicas entra na presente década como um dos países que reúnem condições favoráveis a ampliação da sua presença como economia mundial, atraindo investimentos internacionais e articulando obras que permitam aumentar a sua infra-estrutura para atender ao mercado interno. Entretanto atender a essas condições vem se tornando conflituosas, pois na mesma moeda, o país é representado juridicamente por severas e porque não, avançadas leis ambientais.
Por sua dimensão continental, o Brasil possui vastos ecossistemas, patrimônio genético ecológico e reservas de água doce em abundância. Compatibilizar o desenvolvimento e preservar essas searas tem sido os grandes desafios já que muitas atividades econômicas têm sido dirigidas para região amazônica, com o objetivo de dar a floresta, condições sustentáveis de exploração. Os complexos hidrelétricos do Rio Madeira, por exemplo, sofreram inúmeros questionamentos jurídicos por parte principalmente do Ministério Público Federal devido aos impactos a inúmeras comunidades indígenas.
Outra situação que exemplifica os caminhos do desenvolvimento brasileiro em contraste com suas leis ambientais aconteceu em 2006. A produção de alimentos de origem marinha é irrisória no Brasil ao se comparar com outros países como Japão e Estados Unidos. Naquele ano, o poder público federal através do IBAMA movimentou-se a fim de criar a portaria 39/2006 visando a criação de uma Zona de Amortecimento no Parque Nacional de Abrolhos, e dessa forma, impedindo a execução de um projeto de carnicicultura com recursos privados cuja área estimada seria da ordem de 1.517 ha.
Parte dos temores a esse tipo de políticas desenvolvimentistas está baseada nos problemas recorrentes históricos brasileiros. A questão da pobreza e desigualdade propicia o uso inadequado dos recursos naturais existentes e amplamente noticiados principalmente na região norte brasileira onde ainda imperam modelos extrativistas com técnicas ultrapassadas e por conseqüência, altos índices de degradação ambiental (sem falar no avanço cada vez mais acentuado da pecuária). O argumento relativo à pobreza como principal motor da degradação já levantou a hipótese da preservação ambiental através do pagamento das pessoas que habitam essas áreas com recursos propostos e originários de organismos internacionais, demonstrando a baixa possibilidade de atuação do governo brasileiro em gerenciar esse tipo de situação, inclusive, destacando a questão da soberania nacional em gerir tais problemas, ainda que seja o próprio governo um das razões da problemática.[14]
Em Copenhagen, o Brasil reforçou seu discurso sobre os desníveis do desenvolvimento entre os países e que não poderia ser utilizada a questão ambiental para ser mais um entrave as oportunidades que surgiram ao país, principalmente nesse momento de crise financeira que assola os países centrais[15]. Apesar de uma proposta rudimentar de constituição de um fundo global para cuidar da preservação do meio ambiente, tal ação pouco poderia ter efetividade devido aos problemas de acompanhamento dos gastos desses valores e dos projetos. Ademais o país convive com as limitações legais das suas leis ambientais cujo investimento, não importando sua natureza, são sempre questionados devido a legislação apresentar direcionamento muito amplos e permitindo muitas interpretações ou mesmo a utilização de princípios da prevenção ou precaução indevidamente. A prova disso, é que alguns empreendimentos podem levar décadas para o seu licenciamento ambiental, enquanto na outra ponta, existe uma pressão substancial para que o meio ambiente seja relegado a um segundo plano (dimensionado financeiramente) sob a necessidade do crescimento econômico e sua vantagem para a população.

4. CONCLUSÃO
O acompanhamento mundial da V Conferência sobre Mudança do Clima mostrou o intenso debate de uma preocupação que ainda não possui qualquer consenso entre as partes. E dessa forma, a própria legislação ambiental termina, apesar da sua importância e complexidade, sendo questionada a todo o momento.
A discussão em um sistema que preza pela desigualdade como é o capitalismo, fomenta que as responsabilidades também sejam infinitamente colocadas sob a ótica de quem possui mais poder político e econômico.
Para o Brasil, seu objetivo de concretizar o chamado Desenvolvimento Sustentável não só esbarra no jogo político das relações comerciais a nível global, mas com a pressão de quem hoje é uma das últimas fronteiras dos ecossistemas naturais em vigor no planeta e as possibilidades de aproveitamento desses recursos. Nesse caminho, a legislação ambiental brasileira também (do ponto de vista do empreendedor) é outro obstáculo a ser ultrapassado.
Porém, é de se avaliar positivamente que graças a esse arcabouço jurídico construído ao longo das últimas décadas, a questão ambiental vem sendo tratada com rigor em grande parte das situações. A problemática da sua legislação como já foi citado no Art. 225 da Constituição, é que a reposta para a incógnita da preservação do meio ambiente depende não apenas do poder público, mas da população de maneira geral. E aqui, uma tênue linha se coloca entre as necessidades ambientais e as aspirações humanas.
O evento em Copenhagen simbolizou esse tipo de questionamento. Por mais que as mudanças climáticas surjam como avisos de mudanças em larga escala, é na figura humana e seus anseios a se perpetuar como meta final para atender no jogo político e comercial entre países. O caminho é longo, pois a adoção de tecnologias inovadoras ainda irá levar tempo para ser utilizadas. E pior: em um país como o Brasil onde a precária educação brasileira é causa negativa para o uso de tecnologias, a discussão sobre o meio ambiente é nivelada em um patamar abaixo do que se deve, afinal é preciso interpretar e conhecer a relação de causa e efeito entre natureza e consumo. Pensar ambientalmente leva a reflexões além do tempo presente. E de alguma maneira, essa foi a miopia do evento em Copenhagen.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL: texto constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas Emendas Constitucionais ns. 1/1992 a 62/2009 e pelas Emendas Constitucionais de Revisão ns. 1 a 6/1994, 32ª Ed, Brasília, Ed. Câmara, 2010.


CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resoluções do Conama: resoluções vigentes publicadas entre julho de 1984 e novembro de 2008 – 2. ed. Brasília: Conama, 2008.


HOBSBAWN, Eric. Era dos Extremos : o breve século XX : 1914-1991. São Paulo, Ed. Companhia das Letras, 1995.


LOVELOCK, James. Gaia: Alerta Final. 1ª Edição, São Paulo, Ed. Intrínseca, 2010.


MORE, Rodrigo Fernandes. A segurança ecológica como princípio de segurança coletiva, 1999. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3308&p=1


TIMOSHENKO, A. “Ecological security: Response to global challenges”. In WEISS, Edith Brown (org.). Environmental Change and International Law. Tokio: United Nations University Press, 1999.



[1] Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Salvador (UNIFACS), Graduando em Licenciatura em Geografia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e aluno da Especialização em Desenvolvimento Regional e Planejamento Ambiental pela Universidade Salvador (UNIFACS).
[2] Usamos propositalmente aqui o uso do termo ‘aparentemente’ pois muitas análises e situações envolvendo a questão natural parecem fazer uso de uma análise de um breve momento, quando na verdade em uma questão de escala, a atividade humana pouco representa na vida do planeta como um todo. Um grande exemplo é o próprio petróleo cuja formação se deu a milhões de anos atrás em condições geológicas específicas e que devido ao dinamismo do planeta, podem ou não voltar a se repetir. A própria questão do tempo para o consumo pode ser ampliada com o uso de tecnologias redutoras e mais eficazes.
[3] CARNEIRO, Leandro O. Meio Ambiente e Política: A formulação do pensamento ambiental para um contexto global, 2009
[4] Alguns acidentes ambientais geraram diversas críticas devido a envergadura dos seus impactos que assolaram não apenas localmente, mas atingiu ecossistemas e países como um todo. Dentre eles estão o vazamento de cerca de 37 mil toneladas de Hidrocarboneto do navio petroleiro Exxon Valdez em 24 de Março de 1989 cuja área afetada chegou a cerca de 1.200 km2, o clássico problema nuclear causado pela usina nuclear de Chernobyl em 26 de Abril de 1986 cuja poluição pela radiação atingiu grande parte da então União Soviética, Europa Oriental, Escandinávia e Reino Unido, e o acidente em 3 de Dezembro de 1984 em Bhopal, Índia, cujo vazamento de gases tóxicos da Union Carbide Corporation matou cerca de 8 mil pessoas nas primeiras 72 horas.
[5] O chamado I Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) no período do regime militar vigorou entre os anos de 1972-1974. Sua meta era realizar projetos capazes de ampliar a integração nacional, enquanto o II PND (1974-79) tinha como objetivo investir maciçamente na questão energética e na chamada indústria de base, para que dessa forma fosse possível diminuir a dependência de alguns insumos. São dessa época, o Pró-Alcool e a construção de grandes hidrelétricas devido a crise do petróleo que eclodiu em 1973.
[6] A questão da educação ambiental tem sido controversa no país principalmente o seu papel que aparentemente só se traduz nas searas do licenciamento ambiental. Apesar de uma lei, a Educação Ambiental parece ainda deixar lacunas de forma a ser incorporada em outros ramos da sociedade. E aqui reside muitas contradições pois as interpretações do órgão licenciador variam de acordo com os técnicos e suas esferas (municipal, estadual e federal). Alguns utilizam a Educação Ambiental como meio compensatório, enquanto muitos empreendedores se detêm a um processo educacional que em muitos casos só fazem reproduzir o conhecimento alheio praticado internamente através de políticas corporativas e que estão fadadas a ter pouco resultado (coleta seletiva é um exemplo).
[7] Alguns acreditam que a aprovação da lei veio através da comoção nacional causada pelo grave derramamento de óleo na Baía de Guanabara através de dutos de propriedade da empresa Petrobras. Na verdade a aprovação da lei se deu pela necessidade de fazer valer alguns acordos da qual o Brasil é signatário, dentre eles a Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição Causada por Navios, MARPOL (1973) e que depois foi ratificada através do Decreto 2.508/98. Extra-oficialmente, a então oposição política da época suscitava que acidentes assim seriam o pano de fundo para um processo de privatização que estaria em gestação pelo grupo do governo.
[8] A usina nuclear na Lituânia fornecia mais de 70% da eletricidade consumida pelo país, fazendo com que a partir de agora, esse país necessite adquirir energia de países vizinhos como Belarus, Rússia e Ucrânia. Uma das razões estaria na falha do projeto do tipo do reator cujo modelo explodiu em 1986 em Chernobyl, demonstrando aqui um claro caso de segurança ecológica.
[9] A Bolívia foi um dos países a demonstrar preocupação com a obra, temendo que as mudanças com a introdução de empreendimentos dessa magnitude na Bacia Amazônica possam ampliar significativamente o aumento de algumas endemias como malária, entre outras, devido a curta distância que separa suas fronteiras.
[10] Entre os anos de 2007 e 2008, os dados do INPE mostram um aumento da área degradada de 15.987.10 Km2 para 27.417.10 Km2. No tocante ao desmatamento, em 2008 a área desmatada representou 2.240 Km2, e em 2009, 1.140 Km2. Apesar da redução, o IPCC (Painel de Clima da ONU) afirma que cerca de 17% da Amazônia já foram consumidas.
[11] Na onda desses problemas, os Estados Unidos, estavam sob intenso apetite por mudança política com a possibilidade da eleição de Barack Obama.
[12] Citamos aqui James Lovelock, renomado ecologista que levanta a hipótese na sua obra ‘Gaia: Alerta Final’ de que as tecnologias adotadas em prol do ambientalismo, pouco leva em consideração a condição do planeta como um organismo cujas transformações na verdade são mutações que tendem a buscar o equilíbrio e que por si só, a vida das civilizações só existem na forma atual devido ao estado em que o planeta se encontra. Talvez por isso, alguns cientistas estejam adotando teses de capilaridade ecológica, creditando, por exemplo, a importância de biomas como o amazônico no equilíbrio climático e ambiental em escala mundial.
[13] Abrimos um parêntese sobre um bioma tão importante que graças a ineficácia natural de fiscalização de uma área cuja totalidade representa o conjunto de vários países da Europa, continua sendo alvo de novas formas de exploração (e mais sofisticadas) pelos países desenvolvidos através de ONGs. Notório exemplo aconteceu em 1876 quando o então inglês Henry Wickman levou consigo cerca de 70 mil sementes da popular seringueira para o Jardim Botânico de Londres. Com esse feito, a exploração da árvore em outras regiões utilizando uma escala industrial de produção foi uma das razões para a quebra da economia amazonense e do desmonte do ciclo da borracha.
[14] Em 2008, o Ministério do Meio Ambiente divulgou uma lista com os maiores desmatadores do país. Cabendo, por incrível que pareça, a desonrosa primeira posição ao Instituto de Colonização e Reforma Agrária, o INCRA, provando que as políticas públicas de assentamento certamente estão longe do ideal de preservação almejado. (ver: http://www.mma.gov.br/estruturas/imprensa/_arquivos/96_29092008045336.pdf)
[15] Isso é facilmente notado nas propagandas da maior empresa brasileira, a Petrobras, principalmente após a descoberta de grandes jazidas na camada pré-sal, coincidentemente em um momento em que o papel do petróleo como combustível fóssil estava sendo colocado em discussão. Alguns motes exaltando para a “existência” de um novo país a partir de agora também contribui para a visão de que o país está preparado para assumir relevante papel na economia mundial.